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domingo, 24 de junho de 2012
domingo, 10 de junho de 2012
O simples de ser só
Fotografia de Rui Pinto
O simples de ser só prende-se com a eficiência dos actos únicos, a incontornável medida própria, a decisão por conta pessoal. Estes são veículos de conformação da alma porque, se não existem questões, também não serão necessárias respostas.
O simples de ser só é, ser só. E, admitindo todas as perdas do mundo, é irrefutável a tranquilidade de ser "único" num contexto, a liberdade do "descompromisso" numa associação permanente da experiência.
O simples de ser só é isto, o prazer da apatia na espera.
Finalmente, o simples de ser só, é que, como em tudo na vida, só se é para se deixar de ser.
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Pois o que importa não é a luz que acendemos dia a dia...
Fotografia de Rui Pinto
Estrelas vermelhas e brancas nasciam de tuas mãos.
Era em 189… na Chapelle d’Anguillon,
eram as estrelas eternas
do céu da adolescência.
À noite apagaste as lâmpadas
para que achássemos os caminhos perdidos
que nos levam a um alaúde roto e trajes de outra época,
a uma cavalariça ruinosa e um celeiro de festa
aonde se reúnem moças e anciãs que perdoam tudo.
Era em 189… na Chapelle d’Anguillon,
eram as estrelas eternas
do céu da adolescência.
À noite apagaste as lâmpadas
para que achássemos os caminhos perdidos
que nos levam a um alaúde roto e trajes de outra época,
a uma cavalariça ruinosa e um celeiro de festa
aonde se reúnem moças e anciãs que perdoam tudo.
Pois o que importa não é a luz que acendemos dia a dia,
senão a que alguma vez apagamos
para guardar a memória secreta da luz.
O que importa não é a casa de todos os dias
senão aquela oculta numa lembrança dos sonhos.
O que importa não é a carruagem
senão os rastros descobertos por azar no barro.
O que importa não é a chuva
senão suas lembranças detrás das janelas do pleno verão.
senão a que alguma vez apagamos
para guardar a memória secreta da luz.
O que importa não é a casa de todos os dias
senão aquela oculta numa lembrança dos sonhos.
O que importa não é a carruagem
senão os rastros descobertos por azar no barro.
O que importa não é a chuva
senão suas lembranças detrás das janelas do pleno verão.
Te encontramos na última rua de uma aldeia sulista.
Eras um vagabundo de barba crescida com uma menina nos braços,
era tua sombra –a sombra do desaparecido em 1914–
que se detinha a olhar às crianças brincar de bandidos,
ou perseguir gansos sob uma apática garoa,
ou ajudar suas mães a descascar ervilhas
enquanto as nuvens passavam como uma desconhecida,
a única que de verdade nos houvesse amado.
Eras um vagabundo de barba crescida com uma menina nos braços,
era tua sombra –a sombra do desaparecido em 1914–
que se detinha a olhar às crianças brincar de bandidos,
ou perseguir gansos sob uma apática garoa,
ou ajudar suas mães a descascar ervilhas
enquanto as nuvens passavam como uma desconhecida,
a única que de verdade nos houvesse amado.
Ontem à noite.
E ao soar de um sino chamando à festa
se rompe a dura córtex das aparências.
Aparecem a casa vigiada por glicinas, uma moça
lendo no coreto sob o piar de pardais,
o ruído das rodas de um barco distante.
E ao soar de um sino chamando à festa
se rompe a dura córtex das aparências.
Aparecem a casa vigiada por glicinas, uma moça
lendo no coreto sob o piar de pardais,
o ruído das rodas de um barco distante.
A realidade secreta brilhava como um fruto maduro.
Começaram a acender as luzes do povoado.
As crianças entraram em suas casas. Ouvimos o assobio do
titereio que te chamava.
Tu desapareceste dizendo-nos: “Não há casa, nem
pais, nem amor: só há companheiros de jogo”.
E apagaste todas as luzes
para que acendêssemos
para sempre as estrelas da adolescência
que nasceram de tuas mãos num entardecer de mil
oitocentos
e noventa e tanto.
Começaram a acender as luzes do povoado.
As crianças entraram em suas casas. Ouvimos o assobio do
titereio que te chamava.
Tu desapareceste dizendo-nos: “Não há casa, nem
pais, nem amor: só há companheiros de jogo”.
E apagaste todas as luzes
para que acendêssemos
para sempre as estrelas da adolescência
que nasceram de tuas mãos num entardecer de mil
oitocentos
e noventa e tanto.
TEILLIER, Jorge. Antología Destartalada. Santiago de Chile: Ediciones Oratoria, 2010.
sexta-feira, 25 de maio de 2012
Fotografia de Rui Pinto
"É verde...
na espera
na esperança
na dança
na andança
E fala...
de partidas
de vindas
de florestas
de serestas
É verde...
na primavera
na rima vera
na bondade
na tenra idade
E fala...
de jardins
de jasmins
de flores
de amores
É verde...
na terra
na serra
na semente
na mente
E fala...
de estação
de criação
de criança
de bonança"
AjAraújo in Série: As Cores, escrito em 1980
quinta-feira, 24 de maio de 2012
"–Não vive já ninguém em casa –me dizes–; todos se foram. A sala, o dormitório, o pátio, jazem despovoados. Ninguém já fica, pois, que todos partiram.
E eu te digo: Quando alguém se vai, alguém fica. O ponto por onde passou um homem, já não está só. Unicamente está só, de solidão humana, o lugar por onde nenhum homem passou. As casas novas estão mais mortas que as velhas, porque seus muros são de pedra ou de aço, porém não de homens. Uma casa vem ao mundo, não quando a acabam de edificar, senão quando começam a habitá-la. Uma casa vive unicamente de homens, como uma tumba. Daqui essa irresistível semelhança que há entre uma casa e uma tumba. Só que a casa se nutre da morte do homem. Por isso a primeira está de pé, enquanto a segunda está deitada.
Todos partiram de casa, em realidade, porém todos ficaram em verdade. E não é o recordo deles o que fica, senão eles mesmos. E não é tampouco que eles fiquem em casa, senão que continuam pela casa. As funções e os atos se vão de casa de trem ou avião ou a cavalo, a pé ou se arrastando. O que continua em casa é o órgão, o agente em gerúndio e em círculo. Os passos se foram, os beijos, os perdões, os crimes. O que continua em casa é o pé, os lábios, os olhos, o coração. As negações e as afirmações, o bem e o mal, se dispersaram. O que continua em casa, é o sujeito do ato."
VALLEJO, César. “No vive ya nadie…”. Em “Poemas en prosa” (1923-1929),Obra poética completa, Madrid: Alianza Editorial, 1994.
terça-feira, 28 de fevereiro de 2012
Impressões de uma viagem a Atenas I
Da incapacidade real da vontade de "tudo ver" numa viagem, surge um caloroso conforto ao saborear o prazer de algo que nos toca. Como na vida, uma viagem é feita de incontornáveis dissabores, de medos e desilusões, mas, é com o calor, o mesmo deste chocolate que agora tomo, com que "x" obra me toca que percebo a beleza das coisas que nos envolvem. Interessa a imperfeição, os planos falhados, as oportunidades perdidas porque, é na incontornável desilusão que germina o maior dos prazeres humanos, o poder do espanto, o encanto do inesperado.
Porque nunca se repetirá este momento, porque nunca a Mafalda sorrirá igualmente debaixo desta mesma luz, nem a Inês, nem a Filipa e, nunca mais o Fred e o Diogo dormiram aconchegados em tranquilidade como o fizeram nesta cafetaria em Atenas.
Porque nunca se repetirá este momento, porque nunca a Mafalda sorrirá igualmente debaixo desta mesma luz, nem a Inês, nem a Filipa e, nunca mais o Fred e o Diogo dormiram aconchegados em tranquilidade como o fizeram nesta cafetaria em Atenas.
terça-feira, 21 de fevereiro de 2012
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